quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Incêndios e Mudança Climática (por Jorge Leandro Rosa)

Sobre os incêndios florestais em Portugal em 2017, os factos e os dados são desoladores! Muitos fatores contribuem para este estado apocalíptico, e é urgente enfrentar o problema com seriedade.

O quadro do ICNF mostra que a ardida até julho foi quase 6 vezes superior à média dos 10 anos anteriores, e de acordo com dados mais recentes, em 22/8 a área ardida em 2017 foi de 166 mil hectares!
Dados do ICNF  obtidos no relatório aqui
O interessante texto que se segue, de Jorge Leandro Rosa, alerta para um dos fatores que não pode deixar de ser equacionado: as alterações climáticas.

«INCÊNDIOS E MUDANÇA CLIMÁTICA: O TÍTULO DE PRIMEIRA PÁGINA QUE NUNCA LERÃO NA IMPRENSA PORTUGUESA

Esta notícia do DN - Incêndios voltam a bater recorde e Portugal pede ajuda à Europa) - é apenas um exemplo do inútil e enganador retrato que a imprensa portuguesa tem vindo a dar dos incêndios «recordistas» em Portugal.  Estamos a bater recordes a cada nova vaga de incêndios. Ou é o incêndio com mais mortos, ou o dia com mais incêndios. 

Este sensacionalismo estéril tem o seu eco institucional no «pro-activismo» do governo e das outras forças políticas, ou mesmo na falta de perspectiva da maior parte dos especialistas chamados a opinar. 

Todos os sectores de opinião, incluindo muitos ambientalistas, e sectores da sociedade têm graves responsabilidades nesta obtusa e muitas vezes voluntária negação do aspecto mais sério da crise dos incêndios. Tudo isto seria apenas mais um exemplo do provincianismo local se não fosse a trágica ilustração da incompreensão nacional do que significa para nós a mudança climática em curso.

A mudança climática provocada pela sociedade industrial é o processo mais destrutivo em que a humanidade está ou esteve envolvida. E isto pela simples razão de que o clima (que parece a alguns, em Portugal, uma simples palavra de boletim meteorológico) DETERMINA TUDO. Sendo um processo dinâmico e complexo, ela afecta tudo e todos, mas não da mesma maneira nem à mesma velocidade. 

Portugal está num dos pontos mais sensíveis do planeta: a península ibérica está exposta a processos de desertificação que, muito provavelmente, a tornarão parcialmente inabitável em pouco tempo. As mudanças decisivas nos ciclos das estações estão a alterar o habitat de muitas espécies e, sobretudo, estão a comprometer os recursos aquíferos e a possibilidade de aqui continuar as práticas agrícolas iniciadas no Neolítico. Ou seja, a mudança climática comprometerá, muito rapidamente, a sustentação da vida humana nestes territórios.
Imagem obtida em Fogos.pt (22-8-2017, 23:56)

A sociedade portuguesa entrou numa fase grotesca da sua auto-representação. Embriagada por vagas promessas de relançamento económico, entretemo-nos a discutir de um modo tecnocrático o combate aos incêndios, como se bastasse uma maior eficácia dos dispositivos para resolver aquilo que é, obviamente, um problema global.

O debate sobre o eucalipto tem razão de ser: que sentido faz admitir uma tal espécie num território tão ameaçado e fragilizado? Mas deixa de fazer sentido quando ignora o quadro dinâmico da mudança climática. 

Em geral, estes debates ignoram a complexidade da mudança climática, as novas dimensões da nossa situação, que fazem com que já não hajam catástrofes APENAS naturais ou APENAS humanas. 

O exemplo patético é o debate sobre as falhas do SIRESP e do seu sistema de comunicação de incêndios. Esse debate é um sobrevivente de uma das mitologias pós-modernas, aquela que hipertrofiava o poder da informação para resolver sistemicamente os problemas. 

Ao mesmo tempo, a sociedade portuguesa é uma das sociedades mais motorizadas a nível global: o automóvel privado carbónico é o pequeno deus egoísta que domina as nossas ruas e estradas. E os media, todo e qualquer espaço mediático, estão cheios de anúncios publicitários a automóveis cada vez maiores, cada vez mais apetecíveis, cada vez mais absurdos. 

A passividade dos cidadãos perante esta invasão ideológica do ecocídio motorizado é o melhor retrato do estado da sociedade portuguesa. Os incêndios serão cada vez mais e mais furiosos. E com eles virá o incêndio social e político do Estado português

Jorge Leandro Rosa, 13/8/2017 ( Fonte: tópico "O estado do Espaço Público diante da mudança climática" do grupo Futuro Terra ou aqui)

2 comentários:

  1. Uma sensata abordagem ao estado da nossa nação. Precisamos de acção de todos e cada um de nós.

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  2. Boas!

    Se há coisa que SEMPRE existe no Planeta... é algo a arder!

    Mas, ainda que aceitemos de barato que a PRINCIPAL causa do que ocorreu este ano em Portróical foram as "Alterações Climáticas"... Então resta-nos apenas e só preparar para os próximos fogos! Isto se considerarmos igualmente que a CAUSA PRINCIPAL das "Alterações Climáticas" é a actividade do degenerado animal humano!

    voza0db

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