segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

Em aceleração para o abismo

Para reflexão de fim de ano, um extracto de uma entrevista a Edgar Morin, "Avançamos como sonâmbulos até à catástrofe". Edgar Morin (1921-) é um antropólogo, sociólogo e filósofo francês, um dos grandes pensadores contemporâneos e um dos principais teóricos do campo de estudos da complexidade. Ler aqui artigo completo em português (e aqui o original em francês).  

Edgar Morin; imagem daqui
«A velocidade faz parte do grande mito do progresso que anima a civilização ocidental desde os séculos 18 e 19. A ideia subjacente é que agradecemos a ela por um futuro cada vez melhor. Quanto mais rápido formos em direção a esse futuro, melhor, é claro.
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Esse espírito se desenvolve em detrimento da reflexão e do pensamento. Nosso tempo rápido é, portanto, um tempo anti-reflexo.
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Estamos presos num processo espantoso em que o capitalismo, o comércio e a ciência são atraídos por esse ritmo. Não se pode culpar um só homem. Devemos acusar Newton por ter inventado o motor a vapor? Não. Efetivamente. o capitalismo é essencialmente responsável. Pelo seu fundamento, que é procurar lucro. Pelo seu motor, a competição, que tenta ganhar ao oponente. Pela incessante sede de “novo” que promove através da publicidade …  Que sociedade é essa que produz objetos que ficam obsoletos cada vez mais cedo? Essa sociedade de consumo que organiza o fabrico de frigoríficos ou máquinas de lavar que se inutilizam após oito anos? O mito do novo, como pode ver – mesmo para detergentes – visa  sempre incentivar o consumo. O capitalismo, pela sua lei natural – a concorrência – empurra para uma aceleração permanente, e através da pressão consumista, para a procura de novos produtos que também eles contribuem para esse processo.
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A tragédia dessa velocidade é que ela cancela e mata o pensamento político pela raiz. A classe  política não fez nenhum investimento intelectual para antecipar, enfrentar o futuro. Foi o que tentei fazer em meus livros como Introdução a uma política do homem, Caminho, Terre-patrie … O futuro é incerto, é preciso tentar navegar, encontrar um caminho, uma perspectiva. Sempre  houve ambições pessoais na história. Mas elas estavam relacionados com grandes ideias. De Gaulle sem dúvida teve uma ambição, mas teve uma ótima ideia. Churchill tinha a ambição ao serviço de uma grande ideia, que era salvar a Inglaterra do desastre. Agora, não há mais grandes ideias, mas apenas grandes ambições de homenzinhos ou mulherzinhas.»
Edgar Morin

Fonte (francês): Terraeco, Edgar Morin : «Nous avançons comme des somnambules vers la catastrophe »,  28/10/2011
Tradução para português (do Brasil): Pensar Contemporâneo, Edgar Morin: “Estamos caminhando como sonâmbulos em direção à catástrofe”

3 comentários:

  1. Quando alguém,
    não importa a dimensão que tem,
    generaliza
    perde a razão quanto ao que profetiza

    No Mundo há quem tenha ideias
    mas o que se ostenta é a omissão delas

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