terça-feira, 20 de maio de 2014

Sobre a saúde das gerações futuras

Sobre a saúde das nossas crianças, já vimos aqui o documentário francês "Nos Enfants Nous Accuseront". Agora, fica aqui a tradução livre de um artigo, também francês, de Claude Aubert (engenheiro agrónomo) na revista Biocontact (n.º 246, maio 2014):

«Os nossos filhos viverão mais tempo que nós?

Em matéria de esperança de vida dos nossos filhos, ouve-se tudo e o seu contrário. Que dizer hoje?

Foto obtida em Incredible Edible (Todmorden)
"Uma menina em cada duas que nasce hoje tornar-se-á centenária." " A esperança de vida continuará a aumentar e chegará aos 85 anos em 2030". Estas são afirmações com que nos bombardeiam os estatísticos e os demógrafos. Outros prometem mesmo, senão a imortalidade, pelo menos uma longevidade  de 120 anos ou mais.

Certo, nós vivemos cada vez até mais velhos e a medicina continua a fazer progressos. Os otimistas dão como prova que, apesar da incidência do cancro (o número de casos novos por ano) aumentar fortemente, a mortalidade devido a esta doença tem até agora continuado a diminuir.

No entanto, este cenário idílico é cada vez mais desmentido pelos factos. Pela primeira vez desde há um século, na França, em 2012, a esperança de vida das mulheres diminuiu de 2 meses (1). Pior, a esperança de vida com boa saúde baixou de um ano entre 2008 e 2010 (1). Nos Estados Unidos a esperança de vida está a diminuir em certas regiões. Pode-se invocar causas sociais e pensar que estes valores baixos são passageiros, mas existem causas mais profundas e mais dificilmente reversíveis. Duas descobertas principais na verdade vêm alterar os dados: a origem fetal de doenças e a transmissão epigenética de certas anomalias e patologias.

A origem fetal das doenças

Segundo esta hipótese - que agora se tornou uma certeza - um certo número de doenças do adulto são programadas desde o desenvolvimento do embrião. Sabe-se há muito que quando a mãe fuma ou bebe álcool durante a gravidez, aumenta o risco de aborto espontâneo, de nascimento prematuro e de malformações congénitas. Mas conhece-se menos outros problemas, cujas consequências podem manifestar-se apenas na idade adulta. Alguns exemplos:
- as crianças cujas mães têm mais DDE no sangue (principal metabolito do DDT, o inseticida persistente que foi utilizado massivamente no início dos anos 70, e que se encontra ainda no corpo humano) são mais frequentemente diabéticos e têm um risco de prematuridade mais elevados que os outros (2);
- os rapazes cuja mãe esteve exposta aos pesticidas têm os testículos e o pénis menos desenvolvido do que aqueles cujas mães não estiveram expostas (3);
- uma dieta muito rica em gordura da mãe durante a gravidez aumenta o risco de eczema dos filhos (4).

Quando os avós são (em parte) responsáveis pela saúde dos netos ...

Desde Darwin, que se admite que - salvo circunstâncias particulares - as crianças herdam património genético dos seus pais. Isto não é questionado, mas a expressão de alguns genes pode ser modificada, especialmente sob o efeito de poluentes químicos, e essas mudanças são transmitidas durante várias gerações (transmissão dita epigenética).  Uma experiência surpreendente (5) mostrou que para os ratos expostos ao DDT durante a gestação a doses próximas daquelas a que estivemos expostos nos anos 60-70, não se constata nenhum impacto na sua saúde ou dos seus filhos. Pelo contrário, os filhos destes últimos (3ª geração) e os da geração seguinte, a 4ª geração, são frequentemente obesos e sofrem de diversas patologias. Se extrapolarmos aos humanos, as gerações em risco são aquelas que hoje estão entre os 20 e 30 anos, cujas avós foram fortemente expostas ao DDT na idade fértil, e a seguinte.
Foto obtida em Terre vivante

Portanto, podemos recear que os nossos filhos vivam menos que nós, devido principalmente à poluição e aos nossos erros alimentares. Mas isto não é inevitável, e depende de certas decisões políticas, mas mais ainda no nosso modo de vida.»

1. Insee (Institut national de la statistique et des étude économique, França).
2. Lee, 2006, Longnecker, 2001.
3. Wohlfart-Veje, 2011.
4. Sausenthatler, 2007.
5. Skinner, 2013 

Claude Aubert, pioneiro da agricultura biológica na França, é um dos fundadores da editora Terre vivante . É autor de muitos livros sobre a agricultura biológica, alimentação saudável e da relação entre o ambiente e a saúde. 

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