domingo, 27 de setembro de 2015

"Vírus Idiotas?"

«Se não podemos explicar as grandes questões económicas de maneira a que os jovens as possam entender, é porque nem sequer nós as entendemos.» Yanis Varoufakis, do livro:



Um livro muito elucidativo para jovens e para quem quiser ver, de um modo simples, como funciona a "complexa" economia que a muitos não convém que entendamos....  Um livro em que Varoufakis se dirige à filha adolescente, do qual reproduzo um parágrafo do final do 1º capítulo (daqui):

"É incrível a facilidade com que nos convencemos a nós mesmos de que a repartição da riqueza, sobretudo quando nos favorece, é «lógica», «natural» e «justa». Sempre que sentires que estás prestes a sucumbir a este tipo de pensamentos, lembra‑te daquilo que dizíamos ao princípio: que todos os bebés nascem nus, mas alguns estão predestinados a vestir roupa caríssima, ao passo que outros, a maioria, estão condenados à fome, à exploração e à pobreza. Nunca caias na tentação de aceitar esta realidade como «lógica», «natural» e «justa»."

Transcrevo  também um pequeno sucapítulo do capítulo 7 - "Vírus Idiotas?", sobre a relação da nossa "sociedade de consumo" com o ambiente:

"Vírus megalómanos"

Se dermos uma vista de olhos pelas três grandes religiões monoteístas, o judaísmo, o cristianismo e o islão, chegaremos à conclusão de que os seres humanos se têm em grande conta. Gostamos de acreditar que fomos feitos «à imagem e semelhança» de Deus, do Perfeito, do Único. Que somos semideuses, senhores da Terra, o único mamífero com o dom da razão, e que dispomos da capacidade de adaptar o nosso contexto às nossas necessidades, em vez de nos adaptarmos ao contexto, como fazem os demais seres vivos.

Por isso nos surpreendemos quando uma máquina que nós próprios criámos nos fala como o gente Smith (que na realidade é o reflexo da dita máquina na mente de Neo, no filme Matrix). Recordo o que te contei no final do Capítulo 5, palavras do Agente Smith:
«Qualquer mamífero neste planeta desenvolve instintivamente um equilíbrio natural com o seu ambiente. Mas vocês, os seres humanos, não, vocês são uma excepção... Existe neste planeta outro organismo que tem o mesmo comportamento que vocês. Sabes qual é? O vírus. Vocês, seres humanos, são uma doença, um cancro para o planeta. São uma epidemia e nós, as máquinas, somos a cura.»

O pior é que no fundo, tememos que o Agente Smith tenha razão, para não dizer que pensamos que talvez seja mesmo demasiado benévolo para connosco, pois somos piores que muitos vírus que evitam matar os organismos que os acolhem. Para onde quer que olhemos na Natureza podemos ver as marcas da destruição que deixamos à nossa passagem.

Desde que as sociedades de mercado apareceram, destruímos dois terços de todas as florestas do planeta, provocámos as chuvas ácidas que envenenaram os lagos, drenámos os rios por completo, aumentámos a acidez dos oceanos, erodimos a terra, extinguimos animais e plantas, a tal ponto que o equilíbrio da nossa biosfera, que é o nosso único refúgio, se alterou. Como se tudo isso não bastasse, produzimos cada vez mais gases (como o dióxido de carbono ou o metano) que fazem subir a temperatura do planeta, o que provoca o degelo dos pólos, a subida das águas do mar e a desestabilização do clima da Terra, de tal maneira que povos inteiros correm o risco de desaparecer. Quem pode duvidar que o Agente Smith tem razão? Por acaso não somos parecidos com o vírus do ébola, que se autodestrói ao matar o organismo que o acolhe?

Dir-me-ás, com razão, que o agente Smith não existe. Que é um produto da imaginação de um argumentista, um esforço humano para que as nossas consciências despertem. Como também acontece com Fausto e Frankenstein, personagens fictícios que Christopher Marlowe e Mary Shelley utilizaram para nos avisarem dos males que trouxera a então recém-crida sociedade de mercado. Talvez estes avisos, através da literatura, da arte ou do cinema demonstrem que ainda há esperança de que não nos tornemos uma epidemia, um cancro ou um vírus que ameaça o planeta.

Os vírus, os tumores malignos e as bactérias não têm consciência, mas nós temos. Trata-se da nossa melhor oportunidade de desmentir o Agente Smith. No entanto, para o fazermos temos de ser críticos e protegermo-nos da nossa mais importante criação, mas também daquela que mais contribui para a destruição do meio ambiente: a sociedade de consumo que, pouco a pouco, começou a tornar-se o nosso chefe e, ao mesmo tempo, o pior inimigo do planeta Terra."

 Yanis Varoufakis (negrito meu)

domingo, 20 de setembro de 2015

Natureza Comestível

Já começaram a ser publicados os vídeos "Natureza Comestível", de Alexandra Azevedo, com os quais se pretende:

«Uma abordagem simples e didáctica, que facilite a identificação das plantas e seu uso, em complemento à informação dos livros “Ervas Silvestres Comestíveis - guia prático” e do próximo guia, a publicar ainda este ano, que será sobre os frutos silvestres comestíveis. Após uma breve apresentação de uma planta silvestre comestível, ou ainda uma alga marinha, será demonstrado como preparar e uma (ou eventualmente duas) proposta gastronómica.
Os vídeos são uma co-produção MPI e Quercus, e a equipa é a seguinte: Alexandra Azevedo - autora e apresentadora; Nuno Carvalho - director de câmara; Laura Varges - editora de imagem»



Este é o vídeo de Introdução,  sendo que também já está disponível o vídeo dedicado a:

(Se for possível, esta mensagem será atualizada com os links para os vídeos que entretanto saírem)

domingo, 13 de setembro de 2015

Deslocados

Na Europa, sente-se agora em força o êxodo exponencial de  povos que fogem à guerra e/ou à miséria, e o medo começa a exalar... como narra Valter Hugo Mãe:

«O medo vai inventar todos os horrores para atribuir aos refugiados. O recato das famílias vai temer que o desespero de quem procura sobreviver destrua os valores, partilhe a fome. Estamos pouco habituados à verdadeira solidariedade. Somos genericamente melhor agressores do que cuidadores. Quando falhamos no cuidado, estamos a falhar contra nós mesmos também.

Entendo bem que nos frustre tanto quanto passam os nossos, metidos numa crise imoral, debaixo de governos culpados que atribuem as culpas ao cidadão inocente, mas não posso achar saudável que se vejam as fotografias das crianças mortas como se fossem postais turísticos de uma realidade normalizada para longe de nós. Não há normalidade nem na morte das crianças nem na dessensibilização perante a morte das crianças. Ao menos isso, deixemos que se sinta profundamente, e pensemos honestamente, humanamente, que é preciso solucionar.

Não vamos jamais resolver todos os problemas. Estaremos sempre aflitos com o grotesco de que os homens são capazes. A única coisa que claramente podemos fazer é optar, no mais profundo de nós, por um lado da barricada. Estaremos do lado dos eternamente desconfiados, aqueles que ab initio já atacam porque não toleram diferenças e recusam qualquer risco, ou do lado dos que guardam a esperança, aqueles que ponderam os riscos mas preferem acreditar que a generosidade é uma terapêutica universal que pode, de facto, irmanar povos, pode irmanar pessoas.

À consciência de cada um, fica o sentido das lágrimas vertidas pelo menino na areia, por todos os meninos e toda a gente que, no resto da conta, apenas procuravam o contrário, viver. Se alguém puder acusar outrem da obscenidade de querer viver, algo estará, por definição, doentiamente errado.»

Valter Hugo Mãe, em "O menino na areia", Público, 13/9/2015

Da capa do relatório World at War, UNHCR
Segundo o relatório do Mundo em Guerra do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR ou UNHCR): 

"No final de 2014, 59,5 milhões de indivíduos estavam deslocados à força como resultado de perseguições, conflitos, violência generalizada ou violação dos direitos humanos, mais 8,3 milhões que no ano anterior. Em 2014, os conflitos e perseguições forçaram uma média de 42.500 pessoas por dia a deixar as suas casas e procurar proteção noutros locais. Mais de metade dos refugiados (53%) têm origem em apenas 3 países: Síria, Afeganistão e Somália. Crianças abaixo dos 18 anos constituem 51% dos refugiados em 2014."




Gráficos  obtidos em: Where Syrians find their refugees (The Economist, 10/9/2015)


A consultar  também:
Refugiados na Europa: a crise em mapas e gráficos, 6/9/2015, BBC Brasil
Situação interna na Síria se deteriora e força milhares de pessoas para a Europa, UNHCR, 9/9/2014


Que mundo este! E cada dia a crise piora! Haja solidariedade dos povos que  podem acolher os que fogem da guerra e da perseguição, enquanto a origem dos males que provocaram esta situação tardam em se resolver.