terça-feira, 5 de junho de 2012

Vandana Shiva: “financeirização da economia está na raiz da crise”

Para marcar o Dia Mundial do Ambiente (sim, para marcar, porque há mais a lamentar do que a celebrar), transcrevo o artigo de Ana Paula Salviatti publicado hoje na Carta Maior sobre a entrevista a Vandana Shiva: “financeirização da economia está na raiz da crise” (também publicado hoje no Correio do Brasil).

Vandana Shiva: “financeirização da economia está na raiz da crise”
Imagem obtida no site de Vandana Shiva
«Em entrevista à Carta Maior, a ativista indiana Vandana Shiva fala sobre suas expectativas em relação a Rio+20. Ela não acredita que a conferência da ONU consiga firmar compromissos de mudanças mais significativas em função da influência das grandes corporações. Neste cenário, defende, o papel da Cúpula dos Povos adquire maior importância. Para Vandana Shiva, a crise atual não poderá ser resolvida com mais financeirização e mais mercantilização.»
Ana Paula Salviatti



«Vandana Shiva, que participará da Rio+20 e da Cúpula dos Povos, é a autora do livro ‘The Violence of Green Revolution’ de 1991 (A Violência da Revolução Verde), uma leitura obrigatória para o debate sobre a produção agrícola alterada pela ‘Revolução Verde’; ‘revolução’ que trouxe para o plano agrícola a lógica que impôs o uso de pesticidas e sementes transgênicas, dentre muitas outras modificações, que Vandana explora profundamente em seu livro, infelizmente ainda sem tradução para o português.


Ela é defensora dos direitos humanos e do meio ambiente, os quais infelizmente muitas vezes são defendidos como causas separadas, mas que possuem intrínseca conexão pois os dois são explorados, cada um a sua forma, pela lógica econômica capitalista.


Vandana trabalha por uma economia verde sem dogmas e não foge ao debate sobre questões necessárias para barrar o avanço da situação que se encontram tanto trabalhadores, como natureza. A ativista também levanta a bandeira da situação das mulheres indianas, da segurança alimentar e da preservação dos povos e culturas locais. É fundadora da ONG indiana Navdanya, que, entre outras agendas, estimula a agricultura orgânica local.


Infelizmente seu livro “The Violence of Green Revolution” não foi traduzido para o português até hoje. Você poderia trazer ao nosso leitor uma exposição dá época em que ele foi escrito juntamente de uma análise dos desdobramentos que se deram dos anos 80 prá cá em relação as perdas da agricultura, não só na Índia como nos outros países.


Comecei a fazer a pesquisa sobre a violência da Revolução Verde em 1984, ano da violência no Punjab, onde a Revolução Verde foi implementada pela primeira vez em 1965. A Revolução Verde teve um Prêmio Nobel da Paz, mas em 1984, Punjab era uma terra de guerra. 30.000 pessoas foram mortas pela violência em Punjab, que é um número 6 vezes maior do que os mortos na tragédia do 11/9. O ano de 1984 foi também o ano do desastre de Bhopal, onde uma fábrica de pesticidas, da ‘Union Carbide’ (hoje Dow), vazou e matou 3.000 pessoas. Desde então, 30.000 pessoas morreram.. Hoje a Índia é a capital da fome e dos suicídios de agricultores. Desde 1997, 250.000 agricultores foram presos por dívidas e tiraram suas vidas.


A senhora traçaria um paralelo entre o modo de produção voltado ao abastecimento e especulação do mercado, as reservas naturais e as condições que se encontram a mão de obra trabalhadora no seu país? Outras regiões do mundo trariam condições semelhantes?


O modelo econômico dominante desperdiça recursos e pessoas. Apesar destes resíduos serem chamados de “eficiente” e “produtivo”. Ele substituiu a produção com a especulação do capital financeiro, e do consumismo para as pessoas. Este modelo é: destruir a natureza e a sociedade em si.


Reformas ou Revolução? O que e o porque a senhora acredita ser necessário para impedir o avanço da situação de degradação das condições tanto humanas quanto naturais contemporâneas?


Duas coisas são necessárias para acabar com essa deterioração. Em primeiro lugar, uma mudança de paradigma e visão de mundo. Em segundo lugar, as pessoas levantarem-se coletivamente e dizer “Basta”. Chega.


A senhora terá a oportunidade de participar da Rio+20 e da Cúpula dos Povos. Quais seriam na sua opinião, as limitações e as contribuições que cada uma delas poderão nos trazer?


A Rio+20 será limitada em firmar compromissos em função da influência das grandes corporações. Essas contribuições podem ser significativas, se reconhecerem a necessidade de restabelecer a harmonia com a natureza – objeto de uma sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas no ano passado – e se reconhecerem que a agricultura ecológica é o caminho para a proteção do planeta e da Segurança Alimentar. A Cúpula dos Povos, os Direitos da Mãe Terra, e o compromisso para uma transformação serão vitais.


Não haveria uma lógica comum entre os mecanismos financeiros criados em torno da questão ambiental e ativos financeiros comuns? Esta mesma lógica é capaz de lidar com problemas ambientais, criados muitas vezes por ela própria? O que a senhora poderia falar sobre este assunto?


Há um provérbio africano que diz: “Você não pode colocar um bezerro dentro de uma vaca bezuntando-o com lama”. A financeirização da economia e a consequente redução da economia a um casino, e os recursos do planeta e processos em mercadorias privatizadas, são a a raiz das crises ecológicas e econômicas. Estas crises não podem ser resolvidas por mais financeirização e mercantilização.»


6 comentários:

  1. Olha! Olha!

    Não é com dinheiro que se lá vai?!? Estranha forma de pensar!

    Os italianos (alguns, muito poucos) tiveram nestes últimos dias uma dádiva do Planeta... Ele permitiu com essa dádiva que naquele local se faça algo de realmente sustentável, que se reconstrua a insustentável "cidade" que lá existia por algo verdadeiramente sustentável... Infelizmente não é assim que os habitantes locais vêem a situação! É pena... E o mais certo é cometerem todos os mesmos erros que no passado já cometeram...

    Quanto ao dinheiro... Só falta agora vir a Senhora Vandana Shiva afirmar que vivíamos melhor sem Ele e sem os Bancos e sem os Mercados... Financeiros! Os outros mercados locais/regionais esses sim são para abater... digo... manter.

    voz a 0 db
    Bjs

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  2. Minha Querida Amiga Manuela Araújo,
    É inteiramente verdade o que aqui está apresentado e reflecte o que se tem dito agora!
    O próprio Papa também já referiu que o TER se tem sobreposto ao SER e enquanto assim pensarmos não sairemos desta malvada crise!
    Beijinhos amigos e solidários.

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  3. Manuela, deixo aqui, porque nunca é demais partilhar:

    PRIVATIZAÇÃO DA ÁGUA A REFERENDO, o povo é que tem que decidir e não políticos que fazem o jogo dos mercados. Assinem esta petição que já conta com 18.151 pessoas: http://www.peticaopublica.com/?pi=P2011N11644

    E isto:

    Venda da Águas de Portugal avança até final de 2012:

    Esta notícia acerca do modelo de privatização da Águas de Portugal, após a visita de Assunção Cristas a Angola, é de um timing no mínimo muito estranho.

    http://economico.sapo.pt/noticias/venda-da-aguas-de-portugal-avanca-ate-final-de-2012_140765.html#frameId=ifrSample1&height=360

    Assinem e divulguem por favor o máximo possível.

    Obrigada

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  4. Voz, quem o "ouvir" e não conhecer, até pode pensar que está a falar a sério!
    Mas que dádiva é essa que fala de Itália? Não me diga que é de Módena!!!

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  5. Olá amigo Luís

    Pois é, mas é uma pena que não aproveitem a Rio+20 (Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável) para dizer, como diz Shiva: "BASTA, CHEGA" a este sistema capitalista predador que está na origem dos grandes males da sociedade e do planeta!

    Vão continuar a falar de taxas de CO2, de taxas de poluidores, de tecnologias "verdes" (umas mais verde claro outras mais verde cinzento e outrsa mais avermelhadas) sem irem ao fulcro da questão.

    Vamos lá a ver o que de lá sai,mas ao que tenho visto nos últimos anos, as minhas expectativas são muito, muito baixas!

    Resta-me alguma esperança na Cúpula dos Povos e nas pessoas que se começam a revoltar (pacificamente) e a criar uma nova versão de sociedade.

    Um abraço e um bom fim de semana!

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  6. Olá Ana Teresa

    Essa história da Privatização da Água é daquelas coisas que só um povo ignorante permite. Será que vamos permitir? Porque já há muito por onde saber no que isso resulta!!!

    Faz muito bem lembrar!

    Obrigada e beijinhos


    (E claro que já assinei essa petição, há cerca de um ano)

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