sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

As opiniões e as crenças sobre o clima...

As opiniões valem o que nós quisermos que elas valham. Na edição do passado fim de semana, do semanário Expresso, devido ao tema do momento a que se dedica a Conferência de Copenhaga, um dos assuntos sobre o qual são emitidos artigos de opinião é o ambiente (e as alterações climáticas).

Alguns jornalistas estão muito incomodados com o impacto que as organizações ambientalistas estão a ter na opinião pública, acusando o ambientalismo de "religião", de crença.

É o caso de Henrique Monteiro (É o Clima uma Ideia Religiosa?), que afirma "que me parece existir no discurso ambientalista uma espécie de religião travestida de ciência". Diz ainda que quando vê toda a gente do mesmo lado da amurada, tende a ir para o outro lado. Não será isto também uma crença nas minorias? No entanto, diga-se que Henrique Monteiro julga que toda a gente tem direito a praticar livremente uma religião, ainda que pareça absurda, e não põe em causa o trabalho a favor do ambiente, apenas pretende é mais provas do que nos é dito como inevitável. É possível que ele não chegue a ver essas provas. Também é possível que nunca, como em muitas outras teorias, se chegue a apurar a verdade da correlação entre a concentração dos gases de estufa e as alterações climáticas.

Há também a opinião de Henrique Raposo (Duendes e Bagas), que afirma que "O ambientalismo é mesmo uma religião oficial, e até já tem personalidade jurídica". Além disso, diz que sabe do que fala ao afirmar que o ambientalismo é uma crendice retrógrada. Está muito preocupado com as questões alimentares, pois os ambientalistas querem que vivamos numa Quaresma de 12 meses. E parece ainda mais preocupado que os "religiosos" tomem decisões políticas, pois acha que "devemos desconfiar sempre das intenções dos monoteístas, venham elas com anjos ou duendes, venham elas com freiras ou com a Quercus". Parece-me que este senhor é um fervoroso crente na "religião" do consumismo, mas como para além do deus do consumo também parece adorar o deus da boa mesa, então não será uma religião monoteísta, o que dá lhe alguma coerência...

Uma opinião diferente é a de Daniel Oliveira (A Dúvida), que transcrevo a seguir:

"Seria necessário imaginar uma cabala sem precedentes para explicar porque quase toda a comunidade científica que estuda o fenómeno entrega a sua credibilidade à tese da influência humana no aquecimento global. Perante isto, a estratégia negacionista passa por instalar a dúvida. E a dúvida faz todo o sentido em relação a qualquer tese científica. Só há um pequeno problema: a dúvida, neste caso, tem a perna demasiado curta e não podemos esperar para ver. Só nos calhou este planeta em sorte. Não teremos outro para corrigir os nossos erros.
No entanto, a dúvida funciona aqui como uma extraordinária eficácia. O que temos de fazer implica um esforço descomunal. Mudar estilos de vida, mudar de formas de produção, perder dinheiro. E se isto não for verdade? Na dúvida, talvez seja melhor não fazer nada. Tentador, não é?
Claro que entre os negacionistas haverá de tudo. Desde os que acreditam genuinamente que estamos perante a patranha do século até aos que olham para a bolsa e acham que o planeta pode esperar pela sua vez. Mas estou convencido que o que move a maioria, como tantas vezes acontece na resistência às evidências científicas, é a ideologia. A ideia de que o mercado, acima de todas as outras coisas, comanda a vida. Que tudo - as pessoas, o tempo, a cultura - é um bem consumível. E se assim é com tudo seria uma maçada se assim não fosse com o primeiro de todos os bens: o planeta. Não são apenas as consequências económicas e políticas que os preocupam. São as consequências morais e filosóficas. E se antes de vender e comprar, de consumir e gastar, fossemos mesmo obrigados a cuidar?"

Sabemos que há outros efeitos naturais a interagir com o clima, muitos deles exteriores à própria Terra. Mas se os gases de estufa são responsáveis pelo ameno clima actual (se não existissem, a temperatura média da Terra seria muito negativa e a maioria das espécies actuais não existiria), por que é que o aumento da sua concentração não provocaria um aumento da temperatura média global? Há também umas leis da física que me parece estarem a ser desafiadas: alguém achará que a Terra, sendo finita, aguentará muito tempo com o crescimento exponencial que a população humana e o consumo dos seus recursos estáo a ter? É de esperar que a natureza reaja à acção predatória que a espécie humana tem tido.

Numa das conferências que assisti num congresso, o biólogo David Avelar da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, perguntou: em que casos, na natureza, se dá um crescimento exponencial como o que se tem verificado no aumento da população humana e respectivo consumo de recursos? E respondeu: apenas nas pragas e nas infecções; e o que acontece a seguir? o decaimento abrupto da população invasora...

Alguns dizem que é preciso sermos muito convencidos para podermos achar que conseguimos interferir com o clima! Mas, bactérias e minhocas interferiram...

Se é verdade que todos têm o direito a uma religião, por mais absurda que seja, o mesmo se passa com a opinião. E a minha opinião é muito próxima da de Daniel Oliveira. É bem possível e provável que o aumento da concentração de gases de estufa interfira na temperatura média da Terra e por conseguinte, no clima. Não, não se trata de religião, mas se isto ou o ambientalismo (que são coisas bem diferentes) fossem religiões, então o consumismo e o capitalismo também o seriam.

Isto é apenas uma opinião, e por isso, vale o que vale!

8 comentários:

  1. Amiga Manuela,

    Muito interessante, especialmente ter posto em contraste as três opiniões e finalmente dar a sua que coincide com a de Daniel Oliveira e com a de toda a gente que tenha o mínimo de massa encefálica.

    Beijo

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  2. Olá Manuela,
    A situação presente está, realmente, numa fase alarmante. Ainda que a opinião (doxa) possa ser a representação de uma crença, não será, necessariamente, conhecimento. No meu entendimento, não está em causa uma "religião", mas sim o problema dos fanatismos. Ora, para um discurso/acção "de sustentabilidade" espera-se todo o suporte de investigação científica (que nem sempre acontece). Por exemplo, o relatório de Meadows (1972) anunciava a problemática dos recursos energéticos e nada mudou... Antes de adoptar uma medida dever-se-ia saber responder a qual o "pressuoposto racional" que dá validade a uma previsão futura. Também é só um parecer pessoal.Um abraço

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  3. Olá Manuela!
    Excelente escolha de artigos a resumir opiniões diferentes - e de sinal contrário - sobre o tema da actualidade.Todos têm certamente direito à sua opinião, mas que um jornalista expresse a sua naqueles termos não abona muito em favor da sua capacidade e isenção para exercer tal ofício.
    Há não muitos anos atrás, os primeiros defensores do ambiente eram tratados com criaturas exóticas, um bando de tolinhos que só queria "chatear", sempre a ver problemas onde não eles existiam.Tratando-os, agora, como apóstulos de uma nova religião será uma forma de os desacreditar -e com algum sucesso, pelo que se vê!
    A conferência já acabou, e a montanha de expectativas criadas, ao que parece, pariu um rato. Para alguns, o mote dado parece ser o de "logo se verá onde isto dar, e depois decidiremos". Se houver tempo - dirão outros; senão poderá ser um "alegre" suicídio colectivo ...

    E se por aqui não voltar a passar a tempo, os meus votos de Feliz Natal para vós, com tudo de bom!

    Um abraço.
    Vitor chuva

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  4. Olá Fernanda, Jeune Dame e Vítor Chuva

    Eu entendo perfeitamente que haja cientistas que não considerem óbvia a relação entre os factores antropogénicos e as alterações climáticas. Também aceito que haja pessoas a quem seja muito mais fácil optar por esta via do que pela contrária, que exige mudança de comportamentos.
    O que eu não entendo é o modo com que tantas das pessoas das que escolheram acreditar que não há aquecimento global, ou que o Homem para ele não contribui, falam e se dirigem às pessoas que optaram pela outra via, a via da protecção do planeta. O segundo jornalista de que falo, é um dos casos. Ridicularizando os outros, cai no ridículo...

    Um abraço

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  5. Pois é minha irmã... O caminho do meio é o mais difícil de encontrar, porque na bifurcação entre o bem e o mal, nada é taxativo, nada está ali a dizer o que é bom e o que é mau... não tem placas de orientação!
    Chega-se á bifurcação e o melhor e mais difícil é avançar pelo caminho que tem de ser feito, desbastado...O Caminho do Meio, o caminho do bom senso!
    Ora aí estão exemplos perfeitos dos detentores da verdade, que ao sê-lo, já puseram o bom senso de lado e pelo que se vê, o bom senso, nada tem a ver com o senso comum, como esses senhores pretendem impingir!
    Azar o deles... falta-lhes a inteligência da humildade, do rigor e da transparência! Azar dos que os ouvem por que se torna mais fácil e azar o nosso que temos de aturar essa arrogância! Haja PACIÊNCIA... um dos atributos para alcançar o Caminho do Meio... mas com pessoas assim... é bastante difícil! :))

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  6. Olá Fada
    Falas bem, o caminho certo não tem tabuleta, e tem de ser desbravado, e de que maneira. Só que com um senso comum que há muito se afastou do bom senso, como dizes, é bem mais difícil...
    Beijos

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  7. Manuela,
    Ao ler as duas primeiras opiniões que apresenta, lembrei-me dos muitos mail que recebi com teorias estapafúrdias atribuídas também a cientistas. Esses mail, pela grafia, eram provenientes do Brasil, e dois deles falavam até do risco de se estar a querer criar um "Estado Comunista Mundial". Veja só onde a teoria da conspiração já vai!
    Beijinho e bom Domingo.

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  8. Olá Josefa
    Não faltam teorias da conspiração a tentar desacreditar aqueles que querem que o planeta seja protegido.
    Estava também a pensar no que disse o Henrique Monteiro, sobre as minorias... será que ele não viu ainda que as pessoas preocupadas com o caminho da humanidade e do planeta, e com a influência dos seres humanos no clima, são ainda uma minoria, infelizmente?
    Um abraço

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